Um novo ingrediente se junta ao já conturbado conflito por terra na região de Tomé-Açu: o ingresso de facção criminosa para tirar proveito do ambiente e extorquir empresários e fazendeiros. Em vista disso, uma operação policial deflagrada na manhã de quarta-feira (23) em Quatro Bocas, na zona rural de Tomé-Açu, nordeste do Pará, resultado em dezenas de prisões.
A ação, que envolveu as polícias Civil e Militar, tinha como objetivo, segundo as autoridades, desarticular uma quadrilha de facção criminosa acusada de furtar dendê em uma fazenda conhecida como Adamor, ou Ada Mor, no distrito de Quatro Bocas. No entanto, indígenas e quilombolas da região, que estariam sendo aliciados pela facção, denunciam abusos, agressões físicas e tratamento desumano durante a abordagem, levantando sérias questões sobre a conduta policial e os direitos das comunidades tradicionais. Esses, alegam ser inocentes e nada ter a ver com os criminosos.
Segundo a PM, a operação envolveu o 3º Batalhão de Missões Especiais (Castanhal), o 48º Batalhão, a Ronda Tática Metropolitana (Rotam) de Belém, o Batalhão Rural e o Batalhão Rodoviário Estadual, com apoio da Polícia Civil de Tomé-Açu. A ação resultou na prisão de 55 pessoas, cinco delas acusadas de integrar uma facção criminosa que ordenava ataques contra propriedades rurais, especialmente plantações de dendê.
De acordo com as investigações, o grupo aliciava indígenas e quilombolas, explorando suas vulnerabilidades, para realizar invasões e furtos como retaliação a empresários que se recusavam a pagar uma “taxa do crime” exigida pela organização.
A operação foi coordenada pelo tenente Israel e contou com a atuação de 42 policiais. Durante a ação, foram apreendidos radiocomunicadores, quatro armas de fogo e munições, dezenas de celulares, coletes e outros materiais utilizados pelo grupo. Os presos foram apresentados na Superintendência da Polícia Civil em Castanhal.
Em um vídeo (veja abaixo), o oficial da PM afirma: “infelizmente,algumas pessoas inocentes se deixam levar por esse tipo de aliciamento. As outras pessoas detidas entram nesse caso só como testemunhas”.
Durante as diligências, os policiais afirmam ter enfrentado resistência, com indivíduos bloqueando a estrada de acesso à Fazenda Ada Mor, propriedade alvo dos furtos. As buscas resultaram na apreensão de dois revólveres (calibres 38 e 32), uma pistola, uma espingarda, munições, rojões, roupas camufladas, capas de colete balístico, algemas, rádios portáteis e motosserras.
Os detidos foram conduzidos à Delegacia de Castanhal para esclarecimentos e devem responder por crimes como furto, formação de quadrilha, porte ilegal de armas e associação criminosa. Para a PM, a operação foi uma resposta contundente ao crime organizado, visando proteger a segurança rural e os interesses econômicos da região.
Outro lado, violência e arbitrariedade
Contrapondo a narrativa oficial, indígenas, quilombolas e colonos da região da Fazenda Ada Mor relatam uma operação marcada por violência extrema e desrespeito aos direitos humanos. Um vídeo gravado no dia 24 de abril, quando membros da comunidade retornaram ao local para recuperar pertences pessoais, mostra um jovem sendo agredido com um soco na costela e duas coronhadas na cabeça.
O policial, visivelmente exaltado, profere xingamentos como “Ei, caralho, não sabe ficar do lado do outro?” e “Para com a tua frescura, para com o teu choro”, enquanto o jovem, com dificuldade para respirar, tenta se justificar.
Testemunhas afirmam que, no dia 24, três viaturas policiais chegaram atirando para o alto e usando frases ameaçadoras e discriminatórias, como “Vocês não deveriam estar aqui” e “Aqui é da empresa”. Sem apresentar mandado judicial ou tentar dialogar, os agentes ordenaram que todos se deitassem com o rosto no chão, apontando fuzis para suas cabeças.
Entre os relatos, destaca-se o caso de uma mulher grávida de três meses, acompanhada de um bebê, que sofreu violência psicológica e física. Uma bomba de efeito moral com spray de pimenta foi lançada em sua direção, forçando-a a fugir para a mata com a criança nos braços. A criança se feriu, e a mãe, debilitada pelo gás e pelo esforço, passou o dia escondida sem acesso a água, comida ou assistência médica, colocando em risco sua vida e a de seus filhos.
As comunidades negam envolvimento com qualquer organização criminosa e afirmam que a operação teve como objetivo real intimidar e expulsar moradores de uma área historicamente reivindicada por indígenas e quilombolas, em benefício dos interesses de uma empresa local. Eles denunciam a ausência de mediação, o uso desproporcional da força e um padrão de racismo e arbitrariedade, exigindo investigação sobre a conduta policial.
Um conflito que demanda investigação e diálogo
O caso de Tomé-Açu expõe as complexas camadas de um conflito que envolve interesses econômicos, direitos territoriais e a atuação das forças de segurança. A PM defende a operação como uma medida necessária para combater uma facção criminosa que, segundo as autoridades, explorava comunidades vulneráveis para praticar crimes rurais.
Já as denúncias das comunidades, corroboradas por imagens e relatos de agressões, apontam para um cenário de abuso de autoridade e violação de direitos humanos, especialmente contra populações historicamente marginalizadas.
É fundamental esclarecer se a operação respeitou os limites legais, se houve excesso no uso da força e se as denúncias de violência e discriminação procedem. Além disso, o caso reforça a necessidade de políticas públicas que promovam a resolução pacífica de conflitos agrários, com respeito aos direitos das comunidades tradicionais e sem negligenciar a segurança pública.
Enquanto as versões permanecem em conflito, a sociedade cobra respostas.
FALA, PM
VÍDEO DOS INDÍGENAS
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