Em uma iniciativa histórica, o Ministério Público Federal (MPF) no Pará emitiu uma recomendação contundente aos órgãos estaduais, exigindo medidas imediatas para regulamentar a pulverização terrestre de agrotóxicos e mitigar os danos à saúde humana e ao meio ambiente. A ação, direcionada à Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas), à Agência de Defesa Agropecuária do Estado do Pará (Adepará) e à Secretaria de Estado de Saúde Pública do Pará (Sespa), reforça a luta contra a contaminação ambiental e o racismo ambiental que afetam comunidades indígenas, quilombolas e rurais no oeste do estado, um dos maiores polos agrícolas do Brasil.
A recomendação, publicada sob o número 4/2025 (veja íntegra, abaixo), é resultado de um inquérito civil que investiga a negligência na proteção de populações vulneráveis, como os indígenas da aldeia Açaizal, do povo Munduruku do Planalto Santareno. A proximidade entre áreas de cultivo intensivo de grãos e moradias tradicionais tem causado impactos devastadores.
Dados alarmantes revelam um aumento de 600% em doenças neurológicas associadas a agrotóxicos na região em apenas uma década, além de 40 denúncias de intoxicação registradas por povos indígenas em 2023. O Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan) contabilizou 92 casos de intoxicação aguda entre 2000 e 2024 nos municípios de Belterra, Santarém e Mojuí dos Campos, mas a Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que, para cada caso notificado, outros 50 permanecem subnotificados.
Casos graves, como a paralisação de aulas em uma escola de Belterra devido à intoxicação de alunos e funcionários, evidenciam a gravidade da crise. Estudos científicos confirmam a presença de agrotóxicos, herbicidas, metais pesados e até inseticidas proibidos em águas subterrâneas e superficiais do Planalto Santareno, comprometendo igarapés, açaizais e a subsistência de comunidades.
O Conselho Indígena Munduruku e Apiaká do Planalto Santareno relatou ao MPF a ausência de barreiras de proteção e a destruição de árvores frutíferas, impactando diretamente a economia e a segurança alimentar local.
O MPF destaca que a exposição desproporcional de povos indígenas, quilombolas e comunidades rurais aos efeitos nocivos dos agrotóxicos configura uma forma de racismo ambiental, agravada pelo uso de agrotóxicos como “armas químicas” em conflitos agrários. Essa prática, segundo o documento, visa expulsar populações tradicionais de seus territórios, violando direitos fundamentais e intensificando tensões fundiárias.
Medidas exigidas: um chamado à ação
A recomendação do MPF estabelece diretrizes claras para reverter esse cenário. À Semas e à Adepará, o órgão recomenda:
- Regulamentação urgente da pulverização terrestre, com distâncias mínimas de 500 metros de áreas habitadas e 250 metros de corpos d’água, ou a criação de barreiras naturais;
- Gestão adequada do descarte de insumos e materiais;
- Avaliação de riscos socioambientais e criação de um sistema de vigilância;
- Banco de dados informatizado para registrar incidentes de contaminação;
- Campanhas educativas e auditorias regulares em propriedades agrícolas.
À Sespa, o MPF solicita:
- Programa de vigilância epidemiológica para monitorar doenças ligadas a agrotóxicos;
- Protocolos de atendimento e capacitação de profissionais de saúde;
- Exames toxicológicos periódicos para populações expostas;
- Campanhas de conscientização sobre os riscos dos agrotóxicos.
Impacto da Ação do MPF
A iniciativa do MPF é um marco na defesa do meio ambiente e da saúde pública no Pará, com potencial de transformar a realidade de comunidades expostas à contaminação. A recomendação, embora não seja obrigatória, tem peso significativo: o descumprimento pode levar a ações judiciais cíveis e penais contra os responsáveis.
Com prazo de dez dias para resposta, a pressão sobre Semas, Adepará e Sespa é alta, e a sociedade civil aguarda medidas concretas para proteger vidas e preservar ecossistemas.
Essa ação reforça o papel do MPF como guardião dos direitos coletivos, especialmente em um contexto de crescente pressão sobre terras indígenas e tradicionais. A regulamentação proposta não apenas previne danos à saúde e ao meio ambiente, mas também promove justiça social ao combater o racismo ambiental e proteger populações historicamente marginalizadas.
VEJA A ÍNTEGRA DO DOCUMENTO:
Recomendação nº 4/2025
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