Governança como Serviço

A introdução do GaaS — Governance as a ServiceImagem criada por IA

“Governança deve competir pela preferência do cidadão, assim como as empresas competem pelo coração do consumidor – com melhores produtos e serviços; inovando e entregando valor crescente.” – Daniel R. Schnaider

Poucos cidadãos ousariam afirmar que os serviços públicos em seus países se encontram em um “estado da arte”. Porém, a pergunta que se impõe é: onde e como promover mudanças efetivas que melhorem duradouramente a vida das pessoas? Ajustes burocráticos em “Constantes, Parâmetros e Números” – como subsídios, tributos e juros, a exemplo de impostos sobre combustíveis fósseis – servem como incentivos à inovação e tendem a reduzir o consumo, mas não rompem as correntes que nos atam a fontes de energia insustentáveis.

Mudanças em buffers ou estoques são utilizadas para amenizar impactos externos. Reservatórios maiores podem ajudar a regular o abastecimento de água em períodos de seca, mas não reduzem os padrões de consumo. Conexões físicas ou fluxos são intervenções mais onerosas e demoradas, porém podem gerar impactos positivos: construir ferrovias em vez de rodovias altera o fluxo de transporte, barateia a movimentação de pessoas e mercadorias, reduz o número de acidentes fatais e as emissões de carbono.

O fluxo de informação também exerce impacto significativo. A transparência em rótulos de alimentos influencia o comportamento do consumidor. Implantar mecanismos de feedback pode ser crucial. Os bancos centrais elevam ou reduzem os juros com base em indicadores como inflação e gastos fiscais. Em outras palavras, vários mecanismos transmitem sinais que devem ser interpretados, resultando em ações específicas. No entanto, há sinais cujo resultado social é negativo: ladrões que roubam e não são detidos nem punidos sentem-se incentivados a roubar mais, agindo com maior audácia e cooptando comparsas em busca de eficiência.

Portanto, as “Regras do Sistema”, por meio de incentivos, punições e restrições, são fundamentais para que a sociedade alcance todo o seu potencial. Lugares com punições mais severas para crimes de corrupção, como Hong Kong e Singapura, obtêm resultados distintos de países mais lenientes, caso de alguns na América Latina e África. O poder de auto-organização — como aquele observado em instituições que se reestruturam em contraste com modelos rígidos e resistentes à mudança — é também decisivo para potencializar resultados. Basta comparar o dinamismo dos EUA com a realidade da Coreia do Norte ou da Rússia.

Obstante, a grande capacidade de revolucionar positivamente uma sociedade reside na determinação de objetivos (por exemplo, “Vamos a Marte”), no paradigma que molda o sistema (capitalismo versus socialismo) e, por fim, na disposição de transcender axiomas sociais (Inovação).

Civilizações em diferentes condições geográficas, culturais e econômicas terão, obviamente, objetivos diversos. Ainda assim, o debate sobre o propósito dessas sociedades raramente se torna explícito no discurso público ou nas capas dos jornais. De modo geral, nossa atenção recai em aspectos mais superficiais, como a alta da bolsa, o endividamento do governo ou a cotação do dólar.

O paradigma que configura a sociedade impacta profundamente a riqueza e as oportunidades disponíveis à sua população. Isso fica evidente ao comparar a Malásia e Singapura, a Alemanha Oriental e a Ocidental, a Coreia do Norte e a Coreia do Sul. Porém, mesmo países considerados os melhores para se viver acabam estagnando em termos de inovação em seus respectivos “sistemas operacionais” de governança.

Houve uma época em que parecia natural que empresas de energia elétrica, companhias aéreas, telecomunicações, água, mineração e exploração espacial fossem controladas diretamente pelo Estado. Contudo, paradigmas foram rompidos, e a privatização abriu caminho para a concorrência, seguida de inovações que trouxeram mais valor aos consumidores e avanços sociais importantes. Hoje, famílias de classe média-baixa têm bens como celular, internet, ar-condicionados, acesso a serviços de saúde e remédios, além da educação que causaria inveja aos mais ricos de um século atrás. 

Porém, chegou a hora de um novo grande salto: o da governança pública. Cidadania digital, votação, arrecadação de tributos, projetos de infraestrutura, processos de criação de leis, resolução de conflitos e a própria condução da vida civil podem, sim, tornar-se serviços contratados pela população, em que a concorrência estimule a inovação e melhore, em média, a qualidade de vida dos cidadãos.

A evolução do conceito de serviço se desenrola há décadas. Antes, a tendência era de pessoas que compravam veículos; depois, passaram a fazer leasing; e hoje usufruem do transporte sob demanda. Estradas públicas migraram para concessões pagas pelo uso. A NASA, antes um monopólio estatal na exploração do espaço, cedeu espaço à eficiência e audácia de empresas como SpaceX e Blue Origin. Durante muito tempo, o software era vendido como produto; hoje, ele é oferecido como serviço, da mesma forma que ocorre com servidores ou hardware, agora disponíveis na nuvem também como serviço.

A resistência à mudança no setor público não difere de qualquer outro segmento em disrupção. Músicos foram impactados pelo Spotify, atores de Hollywood enfrentam a inteligência artificial, trabalhadores da Revolução Industrial foram substituídos por máquinas, e jornais e revistas perderam terreno para as redes sociais. Portanto, não podemos esperar que os burocratas atuem contra seus próprios interesses; caberá à iniciativa privada, seja ela com ou sem fins lucrativos, liderar mais uma vez a “destruição criativa” com a introdução do GaaS — Governance as a Service.

Um exemplo emblemático de grande experimento social que, em seus estágios iniciais, enfrentou enormes dificuldades, ajustes constantes e erros administrativos, mas que por fim se provou superior aos modelos anteriores, foi a formação dos Estados Unidos como uma federação democrática. 

Nos primeiros anos após a independência, os estados operavam quase autonomamente, com disputas fiscais, desafios de infraestrutura e intensos debates sobre o poder central. Porém, graças a sucessivas reformas constitucionais, à criação de instituições sólidas e à capacidade de corrigir rumos com o tempo, esse modelo de governança prevaleceu, demonstrando-se mais flexível e inovador do que as monarquias e sistemas rígidos que o precederam. Chegou, assim, o momento de uma nova revolução: transcender o modelo atual para algo que se ajuste aos desafios de nossa era — é hora da Governança como Serviço.

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