O eclipse de Halley e a previsão que revolucionou a astronomia

Na manhã deste sábado, 29 de março, a Lua encobriu parcialmente o Sol, em um fenômeno visível apenas em algumas localidades do Hemisfério Norte, principalmente no nordeste do Canadá, onde a Lua ocultou mais de 90% do Astro Rei, formando uma espécie de chifre solar. Agora, mais impressionante do que as imagens que um fenômeno como este pode gerar, é a precisão com que os astrônomos conseguem prever um eclipse atualmente. 

[ Eclipse Parcial do Sol deste dia 29 de março registrado de Agatha, EUA – Créditos: Vinod Kumar ]

Como já vimos anteriormente nesta coluna, a humanidade desenvolveu a capacidade de prever eclipses por volta do ano 600 a.C., quando astrônomos babilônicos perceberam que eles ocorrem em ciclos de 18 anos, 11 dias e 8 horas, o chamado Ciclo de Saros. Por mais de 2 mil anos, o Ciclo de Saros foi utilizado para prever esses alinhamentos cósmicos, até que em 1715 um Eclipse Total do Sol mudou para sempre a história da astronomia. Pela primeira vez, um eclipse não apenas foi previsto, mas sua sombra foi mapeada com uma precisão jamais vista. O avanço daquele eclipse sobre o território inglês foi calculado com exatidão por Edmond Halley. É… aquele mesmo do famoso cometa! 

Mas esse grandioso feito de Halley só foi possível graças ao embasamento fornecido 3 décadas antes, por um dos maiores gênios da humanidade: Isaac Newton.

Em 1687, quando publicou sua obra-prima, “Principia Mathematica”, Newton revolucionou a física e a astronomia, descrevendo as leis da gravidade e fornecendo a base matemática que rege a mecânica celeste. Edmond Halley, além de amigo e grande incentivador de Newton, foi um dos primeiros a perceber o potencial dessa nova ciência. Com sua inteligência e perspicácia, Halley utilizou a física de Newton para calcular a órbita do cometa que ganhou seu nome, e também para prever eclipses com uma precisão nunca antes vista.

[ À esquerda, Isaac Newton. À direita, Edmond Halley – Créditos: Godfrey Kneller / Richard Phillips ]

Em seus estudos sobre esses fenômenos, Halley se deparou com os antigos textos babilônicos que descreviam a ocorrência cíclica de eclipses. Foi ele quem introduziu o termo “Ciclo de Saros” para descrever a repetição dos eclipses, adotando o nome a partir daqueles registros históricos. Halley também se debruçou sobre os cálculos da mecânica celeste, levando em conta a posição do Sol, da Terra e da Lua, e aplicando as leis da Gravitação Universal de Newton para prever o Eclipse Total do Sol de 1715. E Halley não apenas previu a data e a hora do eclipse, mas também calculou, com uma impressionante precisão, a trajetória da sombra da Lua sobre a Inglaterra, determinando até mesmo a duração da totalidade — um feito extraordinário para a época e um marco na história da astronomia. 

A previsão de Halley foi publicada em um mapa detalhado, que mostrava o caminho da totalidade do eclipse sobre a Inglaterra, com a hora exata em que a sombra da Lua chegaria a cada local. E no dia 3 de maio de 1715, o eclipse aconteceu exatamente como Halley havia previsto! A sombra da Lua percorreu o Sul da Inglaterra, transformando o dia em noite por pouco mais de 4 minutos, em um espetáculo que encantou e maravilhou a todos que o testemunharam. A precisão da previsão de Halley foi um triunfo da ciência, fortalecendo a confiança nas leis de Newton e consolidando a astronomia como uma ciência exata.

[ À esquerda, Isaac Newton. À direita, Edmond Halley – Créditos: Godfrey Kneller / Richard Phillips ]

As pequenas discrepâncias observadas na trajetória da sombra do eclipse em relação às previsões de Halley foram fundamentais para aprimorar os dados orbitais da Lua. Com base nesses ajustes, ele conseguiu calcular com ainda mais precisão outro eclipse que ocorreria na Inglaterra nove anos depois, em 1724.

O trabalho pioneiro de Halley abriu caminho para previsões de eclipses cada vez mais precisas. Nos séculos seguintes, os astrônomos refinaram os métodos de cálculo, levando em conta fatores como a forma da Terra, a influência gravitacional dos planetas e, mais tarde, até mesmo os efeitos da relatividade de Einstein. Com o desenvolvimento de computadores e modelos matemáticos avançados, as previsões de eclipses hoje são feitas com precisão milimétrica, permitindo aos astrônomos determinar o tempo exato de início, fim e duração de cada fase do eclipse em qualquer lugar do mundo. Satélites como o DSCOVR, da NASA, monitoram os eclipses em tempo real, fornecendo dados valiosos para os cientistas e aprimorando nossa compreensão da dinâmica gravitacional entre a Terra, a Lua e o Sol.

Graças a essa evolução, já sabíamos que o eclipse de 29 de março seria visível no Brasil somente em uma pequena área do norte do Amapá, onde, no ápice do fenômeno, a Lua encobriria apenas 1% do disco solar. Mas também pudemos dizer que este seria um belíssimo eclipse parcial para os observadores do nordeste do Canadá, onde o Sol nasceu mais de 90% eclipsado, proporcionando um espetáculo de tirar o fôlego. Só não foi tão marcante quanto aquele que ficou conhecido como “O Eclipse de Halley” e que revolucionou a ciência ao demonstrar o poder da matemática e da física para desvendar os segredos do Universo. Se hoje podemos planejar, com antecedência, os melhores locais e horários para contemplar a beleza de um eclipse, é porque gigantes como Isaac Newton e Edmond Halley pavimentaram esse caminho há mais de três séculos, transformando o céu em um relógio cósmico cuja precisão continua a nos maravilhar.

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