A história da famosa prisão de Alcatraz, que Trump mandou reabrir


O presidente dos EUA anunciou que está ordenando a reabertura e ampliação de Alcatraz, — outrora conhecida como uma das prisões mais severas dos EUA — serviria, segundo ele, como um ‘símbolo da lei, da ordem e da justiça’. Prisão de Alcatraz
Getty Images via BBC
Donald Trump anunciou que está ordenando a reabertura e ampliação de Alcatraz, a famosa e antiga prisão localizada em uma ilha próxima à Ponte Golden Gate, em San Francisco.
Em uma mensagem publicada no domingo em sua rede social, a Truth Social, o ex-presidente dos Estados Unidos afirmou que “o país tem sido assolado por criminosos violentos, reincidentes e impiedosos”.
A reabertura de Alcatraz — outrora conhecida como uma das prisões mais severas dos EUA — serviria, segundo ele, como um “símbolo da lei, da ordem e da justiça”.
Líderes do Partido Democrata disseram que a proposta “não é séria”. A prisão de segurança máxima, também conhecida como “The Rock” (“A Rocha”), foi fechada em 1963 e atualmente funciona como um ponto turístico de sucesso.
“Hoje, estou instruindo o Departamento Federal de Prisões, juntamente com o Departamento de Justiça, o FBI e o Departamento de Segurança Interna, a reabrir uma Alcatraz substancialmente ampliada e reconstruída”, escreveu Trump.
Segundo ele, a prisão abrigaria “os criminosos mais impiedosos e violentos da América”.
O presidente Trump tem enfrentado disputas com a Justiça devido à sua política de enviar supostos membros de gangues para uma prisão em El Salvador.
Em março, ele enviou mais de 200 venezuelanos acusados de envolvimento com gangues para lá. Trump também já falou sobre a possibilidade de mandar “criminosos nacionais” para prisões estrangeiras.
Alcatraz foi inicialmente um forte de defesa naval, tendo sido reformado no início do século 20 para funcionar como prisão militar. O Departamento de Justiça assumiu o local na década de 1930 e passou a receber detentos do sistema prisional federal.
Segundo o site do Departamento Federal de Prisões, Alcatraz foi fechada por ser cara demais para manter: operar a unidade custava quase três vezes mais do que qualquer outra prisão federal, principalmente devido à sua localização insular.
Transformar Alcatraz novamente em uma prisão funcional exigiria uma quantia enorme de dinheiro, disse o professor Gabriel Jack Chin, da Faculdade de Direito da Universidade da Califórnia em Davis, à BBC.
O sistema prisional federal atualmente opera com cerca de 25% a menos de presos em relação ao seu pico, e “há muitas camas vazias” nas prisões já existentes, afirmou Chin. “Portanto, não está claro se há necessidade de uma nova prisão.”
Alcatraz tem “uma reputação de prisão severa”, e Trump está tentando transmitir a mensagem de que sua administração será dura contra o crime, acrescentou o professor.
A ex-presidente da Câmara, Nancy Pelosi, democrata da Califórnia cujo distrito inclui Alcatraz, classificou a proposta como “não séria”.
Já o senador estadual democrata por San Francisco, Scott Wiener, disse em uma postagem no Instagram que a ideia é “profundamente desequilibrada” e representa “um ataque ao Estado de Direito”.
Trump afirma que vai reabrir prisão de Alcatraz
A história de Alcatraz
Localizada em uma ilhota árida e rochosa no Pacífico Norte, a primeira fortificação de Alcatraz for construída por volta de 1850 e utilizada como uma prisão militar.
Mas a fama de Alcatraz se firmou nos anos em que esse rochedo em frente à baía de San Francisco, no norte da Califórnia, abrigou uma prisão federal de segurança máxima e serviu de lar forçado a alguns dos gângsteres mais temidos dos Estados Unidos.
Entre 1934 e 1963, ”A Rocha”, a alcunha que Alcatraz ganhou, foi a prisão modelo em que eram detidos criminosos considerados demasiadamente perigosos para as prisões do continente.
Alcatraz viveu a sua fuga mais célebre 50 anos atrás, em parte porque nunca mais se soube o paradeiro dos três detentos que escaparam. E também porque, depois disso, o governo americano ordenou o fechamento da penitenciária. Mas a lenda construída em torno do local seguiu se alimentando de relatos orais e de filmes de Hollywood.
Autoridades locais avaliaram que o presídio fornecia segurança suficiente para frustrar qualquer tentativa de fuga. O argumento deles é de que seria impossível sobreviver na costa por causa das fortes correntes ou das baixas temperaturas das águas.
Em 1912, ali foi erguido o, à época, maior edifício de concreto armado em todo o mundo. Mas foi o ano de 1933 que selou a fama de Alcatraz como uma prisão diferente.
Ela se converteu na ”prisão das prisões”, como a chamou a agência americana de prisões. Na prática, isso significava que o local passaria a receber a população carcerária considerada demasiadamente indisciplinada para outros centros de detenção nos Estados Unidos.
Ela também serviu como modelo para o sistema de prisão chamado de 1 x 3, com um guarda designado para cada três detentos. Esse padrão logo passaria ser empregado em outras prisões federais.
O primeiro guarda da prisão foi James Johnston, que considerava a penitenciária como um espaço de disciplina extrema, mais que um espaço de reabilitação e reinserção social dos detidos.
Sob a autoridade de Johnston, cada detido ganhou uma cela individual. A medida não se tratou de um luxo. O confinamento solitário era uma forma de evitar complôs e tentativas de fuga.
A mais severa regra em vigor, segundo relataram detentos, era ter de manter silêncio extremo. Os presidiários só podiam conversar durante os recreios dos finais de semana. E os que demonstravam uma conduta considerada inapropriada eram enviados ao chamado ”buraco”, um espaço subterrâneo em que os punidos chegavam a ficar confinados por semanas inteiras.
Detentos famosos
De acordo com agência americana de prisões, a população carcerária de Alcatraz se manteve sempre abaixo da capacidade máxima do recinto. Em média, ela abrigou entre 260 e 275 prisioneiros, representando apenas 1% do total de presos em cárceres federais. Mas foram os personagens atrás das grades que ajudaram a consolidar a lenda de Alcatraz, sobretudo figuras de destaque do crime organizado na época da Grande Depressão no país.
O mais famoso foi sem dúvida o mafioso Al Capone, líder de uma organização contrabandista com base em Chicago. Ele foi enviado ao presídio porque, segundo as autoridades americanas, sua reclusão anterior, em Atlanta, não o havia impedido de continuar comandando a máfia.
O mafioso ficou em Alcatraz por pouco mais de quatro anos, até ser diagnosticado com sífilis e transferido para outra prisão.
Outro detento que ficou conhecido é Alvin Karpowicz, apelidado como “Creepy Karpis”, que liderou o ranking dos “mais procurados” do FBI nos anos 1930 e tornou-se o preso com a mais longa estadia na ilha: 25 anos e um mês.
Também passaram pelo local o gângster George “Machine Gun” Kelly Barnes e Rafael Cancel Miranda, membro do Partido Nacionalista de Puerto Rico e responsável por um ataque armado contra o Congresso americano nos anos 1950.
Fugas frustradas
Nem os mais sofisticados mecanismos de segurança da época foram suficientes para impedir que alguns detentos tentassem fugir. A administração do presídio contabilizou 14 tentativas de fuga envolvendo 36 pessoas durante mais de 30 anos. Destes, 23 foram recapturados, seis morreram baleados durante a fuga e outros dois afogados.
Cinco deles, no entanto, jamais foram reencontrados e passaram a integrar uma lista de “desaparecidos”.
A primeira tentativa de fuga ocorreu ainda em 1936, só dois anos após a inauguração da penitenciária. Jow Bowers escalou o muro de segurança mas acabou sendo baleado. Em 1945, John Giles chegou a sequestrar um barco militar e chegar ao continente, mas foi detido novamente.
Os últimos a tentarem fugir foram Frank Morris, Clarence Anglin e Jogn Anglin, em 1962, e John Scott e Darl Parker, no mesmo ano. A prisão foi desativada pouco depois.
A Alcatraz de Hollywood
O filme A Rocha, de 1996, trouxe Nicholas Cage e Sean Connery como astros principais e mais uma vez destacou a prisão cuja fama e imagem foram tradicionalmente alimentadas por Hollywood ao longo do século 20.
Historiadores e documentaristas, no entanto, dizem que o retrato hollywoodiano da ilha nem sempre foi fiel à realidade.
“Alcatraz não foi a ‘prisão maldita’ dos Estados Unidos, como muitos filmes e livros a caracterizaram. Na verdade muitos presidiários consideravam que as condições de vida, como as celas individuais, eram superiores às de outras prisões federais no país”, diz um porta-voz da agência americana de penitenciárias.
Outro filme famoso sobre a ilha é Fuga de Alcatraz, de 1979, protagonizado por Clint Eastwood e tendo como foco a última tentativa de escape do local, de Frank Morris e os irmãos Anglin.
Neste ano foi lançada também uma série de TV de nome Alcatraz, mas logo após sua primeira temporada acabou sendo cancelada.
Fora de funcionamento
Além das tentativas de fuga, outro fator contribuiu para o fechamento do presídio de segurança máxima: seus altos custos de manutenção.
Em 1963 o Departamento de Justiça americano avaliou que era necessário um investimento de US$ 5 milhões (um valor que hoje corresponderia a cerca de R$ 25,5 mihões) para reparar as estruturas danificadas pelo salitre.
Após seu fechamento oficial como presídio, no entanto, o local foi tomado por indígenas da organização “Aborígenes de todas as tribos”. O objetivo era criar uma escola e um centro cultural na ilha que, segundo eles, tinha sido entregue pelo governo a chefes tribais no século 19.
O projeto encontrou muitas dificuldades e não teve continuidade.
Atualmente a ilha de Alcatraz é um dos pontos mais visitados de São Francisco, com cerca de 1,3 milhão de turistas por ano, e serve também de ponto de partida para uma competição anual de triatlo, “Fuga de Alcatraz”, em que centenas de atletas provam que, com treinamento e equipamento apropriados, é possível sair da ilha e chegar são e salvo à terra firme.
*Com informações de reportagens de Gabriela Pomeroy, da BBC News, e Valeria Perasso, da BBC Mundo
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