A denúncia contundente do Ministério Público Eleitoral (MPE), assinada pelo procurador regional eleitoral Alan Mansur, coloca o senador Beto Faro (PT) no centro de um escândalo de captação ilícita de sufrágio durante as eleições de 2022 no Pará. O caso, que será julgado nesta quinta-feira, 8, pelo Tribunal Regional Eleitoral do Pará (TRE/PA), ganha força com depoimentos detalhados de testemunhas que expõem um suposto esquema coordenado pela empresa Kapa Capital para angariar votos em favor de Faro, eleito senador naquele pleito. Leia no final da matéria a íntegra da manifestação do MPE
As declarações, reforçadas por gravações e documentos periciados pela Polícia Federal, pintam um quadro alarmante de abuso de poder econômico e compra de votos, com promessas de vantagens financeiras a funcionários da empresa.
Esses servidores relatam, com riqueza de detalhes, a pressão para apoiar a candidatura de Beto Faro. Maria Antonieta Cunha Nogueira, ex-secretária da empresa, por exemplo, descreve uma reunião na sede da Kapa Capital, em Belém, convocada de forma obrigatória durante o horário de trabalho. Segundo ela, o sócio-administrador da empresa, Otávio Augusto da Fonseca Pacheco, pediu expressamente que os presentes votassem em Faro, mencionando um “compromisso” de garantir votos para o candidato.
“Foi pedido para que votassem no candidato em questão. O Sr. Otávio mencionou que tinha um compromisso de conseguir alguns votos”, afirmou Maria Antonieta. Ela destaca que os celulares dos funcionários foram retidos na entrada da reunião, um indício de tentativa de evitar registros do evento.
Ainda mais grave, a testemunha relata que Otávio Pacheco prometeu um acréscimo no vale-alimentação para quem apresentasse documentos de eleitores, como títulos e identidades. “Ouvi expressamente na reunião que quem dos presentes apresentasse os documentos pedidos receberia um valor a mais no vale-alimentação”, declarou.
Durante a reunião, Faro teria participado por ligação telefônica em viva-voz, saudando os funcionários, o que reforça o vínculo direto do candidato com o esquema. Maria Antonieta também menciona que documentos de eleitores foram enviados por engano em um grupo de WhatsApp da empresa, evidenciando a prática.
Gravação clandestina e coerção
Outro depoimento crucial é o de Denise de Souza, que trabalhou na Kapa Capital entre 2021 e 2023. Ela confirma a existência de reuniões políticas obrigatórias e revela ter gravado uma delas, entregando o material ao Ministério Público Federal (MPF). Denise descreve um evento disfarçado como “aniversário” da empresa, no clube Bancrévea, onde Beto Faro esteve presente.
Em uma reunião posterior, na sede da Kapa, Otávio Pacheco e Luiz Fernando Lisboa, gerente administrativo, ofereceram uma recarga no vale-alimentação a cada 20 votos captados. “Foram oferecidas uma recarga de vale a cada vinte votos captados. Quem ofereceu a proposta foram o Sr. Otávio Pacheco e o Sr. Luiz Fernando”, afirmou.
Denise vai além, relatando coerção por parte de Otávio Pacheco para evitar denúncias. Segundo ela, o empresário usou o tratamento de saúde de sua filha como barganha, oferecendo um plano de saúde para que ela desistisse de representar contra a empresa. “O Sr. Otávio sabia que minha filha estava passando por tratamento de saúde e utilizou essa informação para barganhar”, disse.
A testemunha admite ter enviado cerca de 80 documentos de eleitores a um número fornecido pela Kapa, recebendo parte do valor prometido. “Chegou a ser encaminhado títulos e documentos no grupo de WhatsApp da Kapa Capital. Mandei em um número específico que a empresa forneceu”, confirmou.
Promessas explícitas de pagamento por voto
O depoimento de Stefany Cristina Lima Correa, ouvida como informante, reforça a narrativa de um esquema estruturado. Ela relata que Beto Faro, participando virtualmente de uma reunião, prometeu um vale-alimentação de R$ 25 por voto angariado. “Beto Faro, ele não estava presente, ele estava online. E falando que quem votasse nele ia cair um vale de alimentação de R$ 25. Cada título era R$ 25”, declarou.
Stefany enviou cinco títulos de eleitor, mas aponta que outros funcionários, como uma colega identificada como Lene, enviaram até 350 documentos. Ela sugere que a participação era vista como obrigatória, sob risco de demissão: “Eu só mandei porque com certeza eles podiam demitir a gente, tipo, ‘esse aqui não está participando, já sabe’”.
Apoio declarado em eventos corporativos
Suellen Medeiros Moura, outra testemunha, confirma que a Kapa Capital declarou abertamente apoio a Faro. “O candidato da empresa era o Senador Beto Faro. A empresa tava apoiando e pediu que a gente desse um apoio caso tivesse interesse”, disse. Ela menciona uma reunião na sede da empresa com participação online de Faro, reforçando a conexão direta entre o candidato e as ações da Kapa.
Pedro Raimundo Ferreira Penha, também ouvido, relata que funcionários foram orientados a comparecer a reuniões políticas, embora ele próprio não tenha participado diretamente.
A posição do MPE: provas robustas
O procurador Alan Mansur sustenta que os depoimentos, aliados a gravações ambientais e documentos periciados, formam um conjunto probatório “sobejamente robusto” que comprova a captação ilícita de sufrágio, prevista no artigo 41-A da Lei nº 9.504/97. Ele destaca a premeditação do esquema, evidenciada pela retenção de celulares, pela obrigatoriedade das reuniões e pela coerção relatada.
“A exigência de entrega de celulares antes do ingresso na reunião demonstra o caráter controlado e intencional do evento, com o objetivo de evitar registros externos”, argumenta Mansur. O MPE pede a cassação do mandato de Faro, de seus suplentes e a aplicação de multas, alegando que o esquema beneficiou diretamente a candidatura do senador.
Um julgamento sob os holofotes
Os depoimentos jogam luz sobre práticas que, segundo o MPE, comprometem a lisura do processo eleitoral no Pará. Enquanto o TRE/PA se prepara para julgar o caso, a sociedade paraense acompanha com atenção, ciente de que o desfecho pode não apenas custar o mandato de Beto Faro, mas também reacender debates sobre a ética nas campanhas eleitorais.
As vozes das testemunhas, carregadas de detalhes e indignação, ecoam como advertência sobre os riscos de abusos de poder em nome da conquista de votos.
LEIA A ÍNTEGRA DA MANIFESTAÇÃO DO MPE
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