Quase um mês após a deflagração da Operação Sem Desconto, que expôs um esquema criminoso de desvios estimados em pelo menos R$ 6,3 bilhões de aposentadorias e pensões do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), o Brasil assiste a um espetáculo de negligência, omissão e manobras políticas que envergonham a nação. O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se encontra em uma posição delicada, tentando a todo custo evitar a instalação de uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) no Congresso Nacional, enquanto encobre o que parece ser um golpe meticulosamente arquitetado contra os mais vulneráveis.
Pior ainda, o governo flerta com a ideia de usar os cofres públicos para cobrir o rombo causado em sua maioria por entidades ligadas a setores da esquerda que apoiam o governo, sem que, até o momento, um único centavo roubado tenha sido devolvido às vítimas.
O escândalo, revelado pela ação conjunta da Polícia Federal (PF) e da Controladoria-Geral da União (CGU), é um dos maiores já registrados na história do INSS. Entre 2019 e 2024, associações e sindicatos, muitas delas de fachada, descontaram indevidamente mensalidades de benefícios previdenciários, usando assinaturas falsas e cadastros fraudulentos.
A CGU estima que cerca de 4,1 milhões de beneficiários foram lesados, com 97% dos entrevistados em auditorias afirmando nunca terem autorizado os descontos. Um relatório da CGU apontou que, de 2019 a 2024, R$ 6,3 bilhões foram desviados, mas, se considerados os dados desde 2016, o montante pode chegar a quase R$ 8 bilhões. É uma cifra astronômica que evidencia a fragilidade do sistema do INSS, descrito como falho, impreciso e desprovido de mecanismos eficazes contra fraudes.
Um sistema à mercê dos larápios
O modus operandi do esquema era tão simples quanto cruel. Entidades, algumas sem qualquer estrutura para oferecer os serviços prometidos, como consultoria jurídica ou descontos em planos de saúde, filiavam aposentados e pensionistas sem seu consentimento. Essas filiações eram validadas por servidores do INSS, muitos dos quais, segundo a PF, recebiam propinas para facilitar o acesso a dados de beneficiários.
Assinaturas eram forjadas, e mensalidades, que variavam de R$ 45 a R$ 77, eram descontadas diretamente dos benefícios antes mesmo de chegarem às contas dos segurados. Em um caso extremo, uma associação chegou a filiar 1.569 aposentados por hora, segundo a CGU, demonstrando a escala industrial da fraude.
O INSS, que deveria ser o guardião dos direitos dos aposentados, tornou-se um campo fértil para a ladroagem. A dispensa da revalidação anual dos descontos, implementada em 2021 durante o governo Jair Bolsonaro (PL) – com apoio de figuras como Wolney Queiroz, então deputado e hoje ministro da Previdência –, abriu as portas para a escalada do esquema.
No entanto, foi sob a gestão de Lula, a partir de 2023, que os descontos explodiram, alcançando R$ 4,1 bilhões, ou 64% do total desviado entre 2019 e 2024. A omissão do governo petista, que recebeu alertas sobre as irregularidades desde junho de 2023, permitiu que o roubo continuasse desenfreado por quase um ano.
O desespero do Planalto e a blindagem dos culpados
O governo Lula está em polvorosa. A demissão do então ministro da Previdência, Carlos Lupi (PDT), em 2 de maio de 2025, após nove dias de pressão, foi uma tentativa de conter o desgaste político. Lupi, que indicou Alessandro Stefanutto para a presidência do INSS – também demitido após ser alvo da Operação Sem Desconto –, foi acusado de negligência por ignorar alertas do Tribunal de Contas da União (TCU), da CGU e do Conselho Nacional de Previdência Social (CNPS).
Sua saída, contudo, não estancou a crise. A nomeação de Wolney Queiroz, seu braço direito e igualmente presente na reunião de 2023 onde as fraudes foram denunciadas, é vista como uma troca de “seis por meia dúzia”. Queiroz, que em 2021 defendeu o adiamento da revalidação dos descontos por causa da pandemia, agora tenta culpar exclusivamente o governo Bolsonaro, esquecendo-se de sua própria responsabilidade.
A articulação do governo para evitar a CPMI é escancarada. Parlamentares da oposição, liderados por figuras como o senador Rogério Marinho (PL-RN) e o deputado Luciano Zucco (PL-RS), já coletaram assinaturas suficientes para instalar a comissão, que promete ser um pesadelo para o Planalto.
O governo, ciente do potencial explosivo da investigação, mobiliza sua base para bloquear a criação da CPMI ou, na pior das hipóteses, garantir que aliados controlem a presidência e a relatoria, limitando o escopo das apurações. A estratégia é clara: responsabilizar a gestão Bolsonaro, onde o esquema ganhou força, e vender a narrativa de que foi Lula quem “desmontou” a fraude, ignorando que 60% dos descontos ocorreram em seu governo.
Um golpe com digitais da esquerda
O que torna o escândalo ainda mais revoltante é a suspeita de que parte das entidades envolvidas tem laços com setores da esquerda que apoiam o governo Lula. O Sindicato Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos (Sindnapi), por exemplo, cujo vice-presidente é José Ferreira da Silva, o Frei Chico, irmão de Lula, arrecadou R$ 154 milhões em 2024, o dobro do apontado em relatórios da CGU.
Embora Frei Chico não seja formalmente investigado, a entidade foi beneficiada por uma “regra transitória” do INSS em 2024, que dispensou a validação biométrica para descontos, facilitando a continuidade das fraudes. Outra entidade, a Contag, presidida por Aristides Veras Santos, irmão do deputado petista Carlos Veras (PT-PE), acumulou R$ 2 bilhões em descontos entre 2019 e 2024.
Esses casos levantam suspeitas de que o esquema pode ter servido para financiar interesses políticos alinhados ao governo, enquanto os aposentados eram saqueados.
Até agora, nenhuma dessas entidades devolveu um centavo aos aposentados. Dos R$ 6,3 bilhões desviados, apenas R$ 2 bilhões foram bloqueados judicialmente, um valor insuficiente para cobrir o prejuízo. A ministra Simone Tebet já admitiu que o governo poderá usar recursos do Tesouro Nacional para ressarcir as vítimas, o que significa que o contribuinte brasileiro será forçado a pagar pela irresponsabilidade e conivência de autoridades.
Essa possibilidade é um tapa na cara dos aposentados, que, além de terem sido roubados, agora veem o governo cogitar usar dinheiro público para tapar o buraco deixado por larápios que operaram sob a vista grossa do poder público.
O calvário das vítimas e a inépcia do governo
Para os aposentados e pensionistas, o escândalo é mais do que uma crise política – é uma tragédia pessoal. Muitos, especialmente os mais idosos e com menor acesso à tecnologia, enfrentam dificuldades para contestar os descontos por meio do aplicativo Meu INSS. Desde a abertura do canal de reclamações, mais de 1 milhão de beneficiários registraram queixas, mas o processo é lento e burocrático.
A CGU revelou que 9,4 milhões de notificações foram emitidas pelo INSS, sugerindo que o número de vítimas pode ser ainda maior. A maioria desconhecia os descontos ou acreditava que eles eram obrigatórios, o que evidencia a falta de transparência e fiscalização.
O governo Lula, que se diz defensor dos mais pobres, tem se mostrado incapaz de oferecer uma solução rápida e eficaz. A suspensão dos Acordos de Cooperação Técnica com as entidades investigadas e a promessa de ressarcimento são medidas tardias, anunciadas sob pressão. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que os valores serão devolvidos, mas o modelo ainda está em estudo, e não há prazo definido.
Enquanto isso, os aposentados, muitos vivendo com benefícios próximos ao salário mínimo, continuam desamparados, enfrentando um calvário para recuperar o que lhes foi roubado.
A necessidade de uma CPMI e o futuro do INSS
O escândalo do INSS não pode ser varrido para debaixo do tapete. A criação de uma CPMI é imprescindível para esclarecer como o esquema operou por quase uma década, quem se beneficiou e por que as autoridades demoraram tanto para agir. A investigação deve ir além da troca de acusações entre governo e oposição. É preciso apurar as responsabilidades de todos os envolvidos, independentemente de filiação partidária, e garantir que os culpados – sejam servidores corruptos, dirigentes de entidades ou políticos coniventes – sejam punidos com rigor.
Mais do que isso, o escândalo expõe a urgência de reformar o sistema do INSS. Controles rígidos, como a exigência de biometria facial e assinaturas eletrônicas avançadas para qualquer desconto, devem ser implementados imediatamente. A fragilidade do sistema, que permitiu a manipulação de milhões de benefícios, é uma afronta aos brasileiros que dependem da Previdência para sobreviver. Sem mudanças estruturais, o risco de novos escândalos permanece.
O governo Lula, ao tentar evitar a CPMI e proteger aliados, demonstra que sua prioridade não é a justiça para os aposentados, mas a preservação de sua imagem. Os larápios da República, que enriqueceram às custas dos “velhinhos”, continuam impunes, enquanto o Planalto joga cortinas de fumaça para desviar o foco.
A sociedade brasileira merece respostas, punição aos culpados e, acima de tudo, a garantia de que o INSS não será mais um playground para criminosos. Que a CPMI venha, e que a verdade prevaleça – doa a quem doer.
Fontes: editorial de O Estado de S. Paulo; relatórios da CGU e PF citados em diversas reportagens; informações do portal Metrópoles e outros veículos.
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