Linha de Tiro: O debate incendiário sobre o futuro da Amazônia e seu povo

Entre o desenvolvimento e a ideologia ambiental, acompanhe como foi a mesa redonda com Belisário Arce, da Organização PanAmazônia

Belém, Manaus, Brasília, Santa Catarina – Em um cenário de crescentes tensões sobre o futuro da Amazônia, o programa “Linha de Tiro” promoveu um debate acalorado com Belisário Arce, diretor executivo da Pan Amazônia, na noite de quinta-feira (22). A discussão, que contou com a participação dos jornalistas Carlos Mendes, Val André Mutran, Emmanuel Vilaça, Jorge Reis, e do professor da UFPA, cientista político e advogado, Elson Monteiro, mergulhou nas complexas intersecções entre desenvolvimento econômico, legislação ambiental e interesses internacionais na região, revelando uma visão crítica e, por vezes, polêmica sobre os rumos da maior floresta tropical do mundo.

Um palco para a controvérsia amazônica

O programa “Linha de Tiro” se estabelece como um fórum para discussões sem rodeios, buscando abordar temas sensíveis com profundidade e diferentes perspectivas. A escolha de Belisário Arce, figura com vasta experiência e trânsito internacional em questões amazônicas, como convidado principal, sinalizou a intenção de um debate franco e “sem papas na língua”, como prometido na abertura. A pauta, que incluiu a COP30, os entraves ambientais, o subdesenvolvimento da Amazônia e as expectativas para a reunião de líderes mundiais em Belém, prometeu desvendar as “amarras” que, segundo os participantes, impedem o progresso da região.

As amarras do desenvolvimento e a “ideologia ambiental”

A discussão central do programa, com mediação do experiente jornalista Carlos Mendes, girou em torno da percepção de que a Amazônia está “engessada” por uma legislação ambiental excessiva e por uma “ideologia ambientalista” que teria se infiltrado nas instituições de controle. Vários temas foram abordados.

O PL 2159/21 e a burocracia ambiental foi o tema de abertura proposto pelo jornalista Val-André Mutran no início do debate, questionando o impacto do projeto de lei (PL 2159/2021), que tramita há 25 anos no Congresso Nacional e visa criar a Lei Geral do Licenciamento Ambiental. A proposta de flexibilização, impulsionada por uma emenda do presidente do Congresso, Davi Alcolumbre (União-AP), é vista como uma tentativa de desatar os nós que prejudicam grandes projetos nacionais. Belisário Arce expressou ceticismo quanto à efetividade de tais aprovações legislativas, citando a atuação do Supremo Tribunal Federal (STF) que, em sua visão, “invade um pouco a esfera dos outros poderes, especialmente do legislativo”.

“Olha, meu receio é que qualquer coisa que seja aprovada no Senado, que vá contra a agenda ambiental, acabe sendo barrado no STF.”

Arce argumentou que órgãos de controle como o IBAMA e o Ministério Público estão “muito infiltrados pela ideologia ambientalista”, resultando em um “engessamento produtivo” na Amazônia. Ele citou casos emblemáticos como a exploração de potássio em Autazes, que há 15 anos não consegue licença, e a pavimentação da BR-319, uma rodovia vital que se tornou intransitável devido à falta de manutenção e entraves ambientais.

Garimpo, contaminação por mercúrio e a conciliação entre desenvolvimento-meio ambiente

O professor Elson Monteiro trouxe à tona a questão do garimpo ilegal e a poluição por mercúrio, reconhecendo os dados reais, mas também os “exageros” e “interesses” por trás da pauta ambiental. Ele questionou como conciliar o desenvolvimento da Amazônia com a proteção ambiental “naquilo que realmente importa”. Belisário Arce, embora não contradizendo o problema do mercúrio, defendeu a regulamentação do garimpo, argumentando que a proibição total gera caos e criminalidade. Ele chegou a sugerir que o impacto do mercúrio na Amazônia pode ser um “mito”, baseando-se em sua experiência no Japão e na ausência de relatos de contaminação em Manaus (AM).

“Eu imagino que a quantidade, eu não sou especialista, hein, dessa área, mas eu, pelo que eu leio, eu sei que o mercúrio, ele pode existir na natureza, ele pode aflorar na terra, na superfície, de forma natural… parece que o impacto do mercúrio é muito pequeno Iorque é diluído nos volumosos rios da região, mas volto a esclarecer:, não sou especialista nessa área.”

Arce reiterou que a legislação ambiental brasileira, influenciada por regimes legais internacionais desde os anos 80, tornou-se uma das mais restritivas do mundo, subordinando a economia ao meio ambiente e gerando pobreza. Para ele, “a pobreza, na verdade, é a causa dos problemas ambientais”.

A OTCA, ONGs e os interesses estrangeiros

O jornalista Emmanuel Vilaça trouxe um tema ligado a diplomacia amazônica. Ele questionou a falta de visibilidade da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA). Belisário Arce, que participou da implantação da sede permanente da OTCA no Brasil em 2003, detalhou a trajetória da organização, desde sua criação em 1978 até sua “politicagem” e “afundamento”. Ele criticou a ingerência de governos estrangeiros, como o alemão, que, ao oferecerem vultosos recursos, teriam “sufocado a organização” e a direcionado para uma “agenda de esquerda” e ambientalista.

“O governo alemão começou a oferecer muito dinheiro… só que quando os alemães entraram… começaram a interferir demais. E aí a ideologia ambiental foi muito forte, a organização começou a ter um foco diferente de sua concepção, a virar para a esquerda, e essa tendência da esquerda só foi piorando.”

Arce acusou o dinheiro da cooperação internacional de ser usado para “comprar influência” e criar uma “grande rede de ONGs” que, em sua visão, trabalham contra o desenvolvimento da Amazônia, como a pavimentação da BR-319. Ele mencionou salários exorbitantes de diretores de ONGs e a influência política dessas entidades.

O assistencialismo e a acomodação social

A discussão se aprofundou nas implicações sociais do modelo atual. Arce criticou programas como a Bolsa Floresta e a Bolsa Verde, que, embora pareçam “bonzinhos”, seriam “cruéis” ao manterem o homem da floresta em isolamento e dependência, impedindo seu progresso.

“É um discurso que parece ser bonzinho, positivo, mas na verdade é crudelíssimo… que criou uma acomodação muito grande nas pessoas.”

Ele argumentou que a pobreza na Amazônia, com IDHs comparáveis a países africanos, é um reflexo desse engessamento.

A COP30: Palanque político ou solução?

A proximidade da COP30 em Belém, agendada para novembro deste ano, foi um ponto de convergência para o ceticismo. Belisário Arce, que já participou de outras COPs, as descreveu como conferências que “não avançam”, “não servem para muita coisa”, e que o aquecimento global, para ele, “não é uma verdade científica, é apenas uma teoria”.

“O que eu vi lá é que, puxa vida, parece assim infantil que eu vou dizer, mas é uma conferência que não avança, que não serve para muita coisa, serve mais para as pessoas fazerem networking… mas de prática em termos práticos não acontece nada.”

Ele expressou a crença de que a COP30 servirá principalmente como um “grande palanque político” para o ano eleitoral de 2026, sem trazer soluções reais para os problemas da Amazônia. A visão é que os “amazônidas não vão ter voz”, pois o evento dará palco apenas a quem “segue a cartilha” dos interesses externos.

Zona Franca de Manaus e a falta de articulação política

A Zona Franca de Manaus foi apresentada como um modelo de sucesso econômico, mas que não conseguiu irradiar desenvolvimento para o interior do Amazonas, que permanece dependente de repasses, notadamente federais. Arce lamentou a rivalidade política entre Manaus e Belém, que impediu uma articulação conjunta em Brasília. Elson Monteiro também ressaltou a inexistência, em contraponto com o Nordeste, de uma Bancada do Norte, unida e propositiva para os interesses da região. Arce defendeu a Zona Franca como o “único modelo econômico na região que deu certo” e que precisa ser defendido.

Perspectivas: O impacto de uma visão desafiadora

As discussões apresentadas no “Linha de Tiro” revelam uma perspectiva que desafia o consenso ambientalista predominante. Ao questionar a base científica do aquecimento global, a eficácia das COPs e a real intenção por trás do financiamento de ONGs, Belisário Arce e os demais participantes buscam desmistificar o que consideram uma narrativa imposta, que impede o desenvolvimento autônomo da Amazônia.

Essa visão, embora controversa, ressoa com setores da sociedade que se sentem marginalizados nas discussões sobre a região. Ela levanta questões importantes sobre a soberania nacional sobre a Amazônia, a distribuição de recursos e o papel das comunidades locais na definição de seu próprio destino.

O debate sublinha a necessidade de uma análise mais profunda sobre quem realmente se beneficia das políticas ambientais atuais e como a prosperidade econômica pode ser integrada à conservação.

A tensão inerente entre prosperidade e proteção

O programa “Linha de Tiro” com Belisário Arce expôs a profunda tensão entre as agendas de desenvolvimento e conservação na Amazônia. A tese central defendida é que a região está aprisionada por uma “ideologia ambientalista” e por interesses externos que, sob o pretexto da proteção, impedem o progresso e perpetuam a pobreza. A solução, segundo Arce, reside na “liberdade para empreender e segurança” jurídica, permitindo que a prosperidade seja o motor da salvação da Amazônia.

“O crucial é liberdade, quem vive na Amazônia precisa de liberdade para empreender e segurança… sem liberdade e sem segurança jurídica não tem para onde ir.”

A reportagem do “Linha de Tiro” serve como um alerta para a complexidade da realidade amazônica, que vai muito além das manchetes simplistas. Ela convida à reflexão sobre a necessidade de um debate mais racional e menos ideológico, que coloque as necessidades e aspirações dos povos da Amazônia no centro das decisões, buscando um equilíbrio que permita tanto a proteção ambiental quanto o desenvolvimento humano e econômico da região. A “festa” da COP30, para os participantes, pode ser apenas mais um palco onde as vozes locais serão silenciadas em favor de uma narrativa global que, para eles, não reflete a verdadeira Amazônia.

* Reportagem: Val-André Mutran é repórter especial para o Portal Ver-o-Fato e está sediado em Brasília.

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