Maior partido pró-democracia de Hong Kong decide encerrar atividades após anos de repressão

Após décadas de atuação política e enfrentamento ao controle da China sobre Hong Kong, o Partido Democrático do território chinês semiautônomo anunciou que iniciou o processo para sua dissolução. A decisão foi tomada por 90% dos cerca de 110 membros presentes em uma votação preliminar realizada no domingo (13). A legenda foi a maior força da oposição na cidade, liderando protestos por sufrágio universal e sendo alvo de duras ações após a implementação da Lei de Segurança Nacional, em 2020. As informações são do jornal The New York Times.

A sigla nasceu na década de 1990, ainda no período de transição do domínio britânico para o chinês, com o objetivo de cobrar o cumprimento de promessas de autonomia e eleições diretas para o chefe do governo local. “Não alcançamos o que nos propusemos a fazer”, disse Fred Li, um dos fundadores do partido. “Sem dinheiro ou recursos, não conseguimos nem sobreviver.”

Nos últimos anos, o partido perdeu espaço político, viu seus líderes serem presos e foi impedido de disputar eleições. Com a exigência de que apenas “patriotas” aprovados por Beijing podem concorrer, nenhum de seus membros ocupa hoje cargos públicos. O presidente da legenda, Lo Kin-hei, já havia indicado que o cenário político tornava inviável a continuidade do grupo, mas evitou entrar em detalhes.

Bandeiras de Hong Kong (esq.) e China lado a lado (Foto: Lianqing Li/Flickr)

A repressão se intensificou após os protestos de 2019 e levou à prisão de diversos ex-parlamentares do partido. Ted Hui, ex-deputado e alvo de um mandado de captura, fugiu para a Austrália em 2021. A legenda também enfrentou tensões internas, com parte dos jovens militantes defendendo uma postura mais dura diante do avanço autoritário do governo central chinês.

Mesmo sem representação institucional desde 2021, o Partido Democrático tentou manter alguma atuação por meio de serviços jurídicos gratuitos e críticas públicas a políticas do governo. Mas enfrentava dificuldades para levantar fundos e lidava com assédio constante a seus integrantes.

“Apesar de não termos cargos, as pessoas ainda confiam em nós”, afirmou Emily Lau, ex-presidenta da sigla. “Mas, diante de tantas prisões, acho nossos membros muito corajosos.”

O partido, fundado por Martin Lee e Szeto Wah, ainda realizará uma nova votação nos próximos meses para formalizar a dissolução.

Por que isso importa?

Após ser transferido do domínio britânico para o chinês, em 1997, Hong Kong passou a operar sob um sistema mais autônomo e diferente do restante da China. Entretanto, apesar da promessa inicial de que as liberdades individuais seriam respeitadas, a submissão a Beijing sempre foi muito forte, o que levou a protestos em massa de 2019.

A resposta chinesa aos protestos veio com autoritarismo, representado pela lei de segurança nacional, que a partir de junho de 2020 deu ao governo de Hong Kong o poder de silenciar a oposição e encarcerar os críticos. O antigo texto vinha sendo usado até março de 2024, quando uma nova lei, ainda mais dura, foi aprovada.

A aprovação do novo texto legal atendeu a uma determinação da Lei Básica, uma espécie de Constituição do território. Ela exigia em seu artigo 23 que um mecanismo legal próprio fosse estabelecido para substituir o anterior, este imposto emergencialmente pela China. A nova versão da lei pune crimes como traição, insurreição, incitação de membros das Forças Armadas ao motim e conluio com forças externas.

Os críticos ao governo local alegam que os direitos de expressão e de associação vêm diminuindo cada vez mais em Hong Kong desde que a antiga lei entrou em vigor, ampliando a repressão aos dissidentes. Já as autoridades locais reforçam a ideia de que a normativa legal é necessária para preservar a estabilidade do território.

Reino Unido, por sua vez, diz que ela viola o acordo estabelecido quando da entrega do território à China. Isso porque havia uma promessa de que as liberdade individuais, entre elas eleições democráticas, seriam preservadas por ao menos 50 anos. Metade do tempo se passou, e Beijing não cumpriu sua parte no acordo. Muito pelo contrário.

Nos últimos anos, os pedidos por democracia foram silenciados, a liberdade de expressão acabou e a perspectiva é de que isso se mantenha por um “longo prazo”. Nas palavras do presidente Xi Jinping, “qualquer interferência deve ser eliminada.”

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