
A recente missão espacial da Blue Origin, composta exclusivamente por mulheres, reacendeu discussões sobre os impactos ambientais da exploração espacial promovida por empresas privadas.
O lançamento, ocorrido na última semana, levou a tripulação a ultrapassar a Linha de Kármán — ponto que marca o início do espaço sideral — a bordo da cápsula New Shepard.
Paralelamente à celebração da iniciativa no meio político e empresarial, ambientalistas e cientistas alertam para os danos crescentes à atmosfera e ao espaço. Um dos pontos centrais é o aumento do lixo espacial.
Segundo a Agência Espacial Europeia, mais de 19 mil satélites foram lançados desde os anos 1950. Desses, cerca de 13 mil continuam em órbita, mas apenas 10 mil estão em operação.
A massa total de objetos espaciais supera 13 mil toneladas, com cerca de 80 toneladas de detritos reentrando na atmosfera anualmente. Durante a reentrada, esses materiais se vaporizam, liberando metais como lítio, cobre e nióbio na estratosfera.
Além dos resíduos espaciais, os combustíveis utilizados nos lançamentos representam outro fator de preocupação. Foguetes como os da SpaceX utilizam querosene, emitindo dióxido de carbono (CO₂), fuligem e outros poluentes atmosféricos.
Estima-se que uma única decolagem libere entre 200 e 300 toneladas de CO₂. Em 2021, o lançamento de um foguete da SpaceX gerou cerca de 358 toneladas do gás, o equivalente às emissões anuais de 25 mil automóveis.
Preocupações de ambientalistas

O ambientalista Daniel César, explica, em entrevista ao Portal iG, que o New Shepard da Blue Origin tem um sistema diferente.
“O foguete usa hidrogênio líquido e oxigênio líquido, que produzem principalmente vapor d’água como subproduto, resultando em emissões diretas de dióxido de carbono praticamente nulas. Só que a produção pode gerar emissões indiretas de CO₂. Há estudos que sugerem que a produção de propelentes para um voo do foguete pode gerar até 57 mil toneladas de CO₂”.
Segundo Daniel, mesmo o vapor d’água pode provocar efeitos climáticos: “O vapor d’água liberado por foguetes como o New Shepard, embora pareça inofensivo, pode formar nuvens na estratosfera e mesosfera. Essas nuvens podem reter calor, contribuindo para o aquecimento global”.
Ele destaca ainda que “foguetes da SpaceX, por exemplo, usam querosene, que emitem CO₂, partículas de fuligem, que contribuem para gases de efeito estufa e, automaticamente, contribuem ao aquecimento global. Isso é preocupante”.
Casos registrados em locais de lançamento também estão no centro das críticas. Em Boca Chica, no Texas, a base da SpaceX foi alvo de ações judiciais após o despejo de resíduos em áreas de proteção ambiental.
O lançamento da Starship em 2023 causou destruição da plataforma e espalhou fragmentos em áreas preservadas. Grupos ambientalistas processaram a Administração Federal de Aviação, alegando falhas na avaliação de riscos ecológicos.
Alves observa que as ações de sustentabilidade variam entre as companhias: “Algumas empresas espaciais têm programas de compensação de carbono, mas os esforços são limitados e variam entre elas. A Blue Origin, de Jeff Bezos, anunciou metas de sustentabilidade, incluindo a redução de emissões em suas operações. Porém, a SpaceX não tem um programa formal direcionado ao assunto”, disse, ao iG.
Falta de regulamentação global
A ausência de regulamentação global específica para a exploração comercial do espaço é apontada como uma lacuna.
A atuação crescente de empresas privadas, com influência política direta em países como os Estados Unidos, dificulta a implementação de medidas coordenadas para contenção de impactos.
Desde 2024, Elon Musk assumiu posição estratégica junto ao governo norte-americano, o que amplia seu poder de decisão sobre políticas regulatórias ligadas ao setor aeroespacial.
A combinação de poluentes como NOx, fuligem e vapor d’água na estratosfera é alvo de estudos sobre suas interações com a camada de ozônio e o aumento da temperatura média global.