
O Vaticano divulgou nesta sexta-feira (25) o conteúdo e os protocolos associados ao “rogito”, documento tradicional que foi inserido no caixão do Papa Francisco. A peça integra os ritos fúnebres do pontífice e consiste em um texto oficial que resume os principais marcos da vida, pontificado e decisões do papa.
A inclusão do rogito ocorreu durante o rito de fechamento do caixão, na Basílica de São Pedro.
O rito foi conduzido pelo cardeal camerlengo Kevin Joseph Farrell e seguiu os procedimentos estabelecidos no Ordo Exsequiarum Romani Pontificis, revisado em 2024 pelo próprio Francisco.
A cerimônia foi coordenada pelo arcebispo Diego Ravelli, mestre das celebrações litúrgicas pontifícias. Ele fez a leitura do rogito em latim diante do corpo presente, seguido da assinatura do documento pelos clérigos que participarão do ato. O rogito foi então depositado dentro do caixão.
Além do rogito, foram inseridos no interior do esquife um pequeno saco com moedas e medalhas cunhadas ao longo dos 12 anos de pontificado de Francisco.
Um véu de seda branca foi colocado sobre o rosto do papa, que também será aspergido com água benta, segundo descrevem os protocolos litúrgicos divulgados pelo Vaticano.
O caixão utilizado é feito de madeira e possui revestimento interno de zinco, destinado à preservação do corpo.
A tampa da urna tem afixados a cruz, o brasão pontifício e uma placa contendo o nome de batismo e papal de Francisco, a data de nascimento e morte, além do período exato de seu pontificado.
A prática de utilizar três caixões, comum em funerais de pontífices anteriores, foi abolida a pedido do próprio Francisco.
O papa morreu na segunda (21), aos 88 anos, após sofrer um acidente vascular cerebral seguido de insuficiência cardíaca irreversível. O falecimento foi confirmado pelo cardeal camerlengo na Casa Santa Marta, residência papal no Vaticano.
Desde 23 de abril, o corpo de Francisco está exposto para visitação pública na Basílica de São Pedro. Até a manhã de quinta-feira (24), mais de 60 mil fiéis haviam passado pelo local.
Funeral

O funeral está marcado para o sábado (26), às 10h (horário de Roma), na Praça de São Pedro. A cerimônia será conduzida pelo cardeal Giovanni Battista Re, decano do Colégio Cardinalício.
Ao término do funeral, o caixão será transferido em procissão até a Basílica de Santa Maria Maggiore, onde ocorrerá o sepultamento, conforme desejo registrado em testamento pelo pontífice.
A escolha do local rompe com a tradição dos últimos papas, que foram sepultados na Basílica de São Pedro. A Basílica de Santa Maria Maggiore abriga a imagem bizantina da Virgem Maria, à qual Francisco expressou repetidamente devoção.
O corpo será depositado em um nicho lateral, entre as capelas Paulina e Sforza, próximo ao altar de São Francisco. O túmulo terá apenas a inscrição “Franciscus” e uma reprodução da cruz peitoral do pontífice.
O encerramento da cerimônia marcará o início dos novendiales, nove dias de orações e missas em memória do papa, conforme tradição milenar.
O Colégio dos Cardeais se reunirá posteriormente para preparar o Conclave, que elegerá o novo pontífice entre o 15º e o 20º dia após a morte de Francisco.
Leia o texto na íntegra abaixo
ROGITO PELO PIEDOSO TRÂNSITO DE SUA SANTIDADE FRANCISCO
MORTE, DEPOSIÇÃO E SEPULTAMENTO DE FRANCISCO DE SANTA MEMÓRIA
“Conosco peregrino da esperança, guia e companheiro de caminho rumo à grande meta à qual somos chamados, o Céu, no dia 21 de abril do Ano Santo de 2025, às 7h35 da manhã, enquanto a luz da Páscoa iluminava o segundo dia da Oitava, Segunda-feira do Anjo, o amado Pastor da Igreja, Francisco, passou deste mundo para o Pai. Toda a Comunidade cristã, especialmente os pobres, louvava a Deus pelo dom de seu serviço prestado com coragem e fidelidade ao Evangelho e à mística Esposa de Cristo.
Francisco foi o 266º Papa. Sua memória permanece no coração da Igreja e da humanidade inteira.
Jorge Mario Bergoglio, eleito Papa em 13 de março de 2013, nasceu em Buenos Aires em 17 de dezembro de 1936, filho de imigrantes piemonteses: seu pai, Mario, era contador, funcionário das ferrovias, enquanto sua mãe, Regina Sivori, cuidava da casa e da educação dos cinco filhos. Formado como técnico químico, escolheu depois o caminho do sacerdócio, entrando inicialmente no seminário diocesano e, em 11 de março de 1958, ingressando no noviciado da Companhia de Jesus. Estudou humanidades no Chile e, de volta à Argentina em 1963, formou-se em filosofia no Colégio São José, em San Miguel. Foi professor de literatura e psicologia nos colégios da Imaculada Conceição de Santa Fé e no Colégio do Salvador em Buenos Aires. Recebeu a ordenação sacerdotal em 13 de dezembro de 1969 do arcebispo Ramón José Castellano e, em 22 de abril de 1973, fez a profissão perpétua como jesuíta. Após ser mestre de noviços em Villa Barilari, San Miguel, professor de teologia, consultor da província jesuíta e reitor do colégio, em 31 de julho de 1973 foi nomeado provincial dos jesuítas da Argentina. Depois de 1986 passou alguns anos na Alemanha para concluir sua tese de doutorado e, de volta à Argentina, tornou-se colaborador próximo do cardeal Antonio Quarracino. Em 20 de maio de 1992, João Paulo II o nomeou bispo titular de Auca e auxiliar de Buenos Aires. Escolheu como lema episcopal Miserando atque eligendo e em seu brasão inseriu o cristograma IHS, símbolo da Companhia de Jesus. Em 3 de junho de 1997 foi promovido a arcebispo coadjutor de Buenos Aires e, com a morte do cardeal Quarracino, sucedeu-lhe em 28 de fevereiro de 1998 como arcebispo, primaz da Argentina, ordinário dos fiéis de rito oriental no país, grão-chanceler da Universidade Católica. João Paulo II o criou cardeal no Consistório de 21 de fevereiro de 2001, com o título de São Roberto Belarmino. Em outubro seguinte, foi relator geral adjunto da décima Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos.
Foi um pastor simples e muito querido em sua arquidiocese, que percorria amplamente, inclusive usando metrô e ônibus. Morava em um apartamento e preparava ele mesmo sua janta, porque se sentia como qualquer outro.
Eleito Papa pelos cardeais reunidos em Conclave após a renúncia de Bento XVI, em 13 de março de 2013, escolheu o nome Francisco, porque, seguindo o exemplo de São Francisco de Assis, queria ter um olhar prioritário para com os mais pobres do mundo. Da sacada das bênçãos se apresentou com as palavras: “Irmãos e irmãs, boa noite! E agora, comecemos este caminho: bispo e povo. Este caminho da Igreja de Roma, que preside na caridade todas as Igrejas. Um caminho de fraternidade, de amor, de confiança entre nós.” E, depois de inclinar a cabeça, disse: “Peço que vocês rezem ao Senhor para que me abençoe: a oração do povo pedindo a bênção para seu bispo.” No dia 19 de março, Solenidade de São José, iniciou oficialmente seu ministério petrino.
Sempre atento aos últimos e aos excluídos da sociedade, Francisco, assim que foi eleito, escolheu viver na Casa Santa Marta, pois não conseguia ficar longe do contato com as pessoas e, desde a primeira Quinta-feira Santa, quis celebrar a Missa da Ceia do Senhor fora do Vaticano, indo a prisões, centros de acolhida de deficientes ou dependentes químicos. Recomendava aos padres estarem sempre disponíveis para administrar o sacramento da misericórdia, a terem coragem de sair das sacristias para procurar a ovelha perdida e a manterem abertas as portas da igreja para acolher quem buscasse o rosto de Deus Pai.
Exerceu o ministério petrino com incansável dedicação ao diálogo com muçulmanos e com representantes de outras religiões, convocando-os para encontros de oração e assinando declarações conjuntas em prol da paz entre os crentes, como o Documento sobre a Fraternidade Humana, assinado em 4 de fevereiro de 2019 em Abu Dhabi com o líder sunita al-Tayyeb. Seu amor pelos últimos, idosos e crianças levou-o a instituir as Jornadas Mundiais dos Pobres, dos Avós e das Crianças. Instituiu também o Domingo da Palavra de Deus.
Mais que qualquer antecessor, ampliou o Colégio dos Cardeais, convocando dez consistórios nos quais criou 163 cardeais, dos quais 133 eleitores e 30 não eleitores, provenientes de 73 países, sendo 23 deles representados por um cardeal pela primeira vez. Convocou cinco Assembleias do Sínodo dos Bispos: três gerais ordinárias, dedicadas à família, aos jovens e à sinodalidade; uma extraordinária, também sobre a família; e uma especial para a região Pan-Amazônica.
Sua voz ergueu-se várias vezes em defesa dos inocentes. Com a pandemia da Covid-19, na noite de 27 de março de 2020, quis rezar sozinho na Praça São Pedro, cujo colunato simbolicamente abraçava Roma e o mundo, pela humanidade assustada e ferida pelo desconhecido. Os últimos anos do pontificado foram marcados por inúmeros apelos pela paz, contra a “Terceira Guerra Mundial em pedaços” em curso em diversos países, especialmente na Ucrânia, bem como na Palestina, Israel, Líbano e Mianmar.
Após a internação de 4 de julho de 2021, com duração de dez dias, para uma cirurgia no Policlínico Agostino Gemelli, Francisco voltou ao mesmo hospital em 14 de fevereiro de 2025 para uma internação de 38 dias por conta de uma pneumonia bilateral. Retornado ao Vaticano, passou as últimas semanas de vida na Casa Santa Marta, dedicando-se até o fim, com a mesma paixão, ao seu ministério petrino, embora ainda sem plena recuperação. No Domingo de Páscoa, 20 de abril de 2025, apareceu pela última vez na sacada da Basílica de São Pedro para conceder a solene bênção Urbi et Orbi.
O magistério doutrinal do Papa Francisco foi muito rico. Testemunha de um estilo sóbrio e humilde, fundado na abertura missionária, na coragem apostólica e na misericórdia, cuidadoso em evitar o perigo da autorreferência e da mundanidade espiritual na Igreja, o Pontífice apresentou seu programa apostólico na exortação Evangelii gaudium (24 de novembro de 2013). Entre os principais documentos destacam-se 4 Encíclicas: Lumen fidei (29 de junho de 2013), sobre a fé em Deus; Laudato si’ (24 de maio de 2015), que trata da ecologia e da responsabilidade humana na crise climática; Fratelli tutti (3 de outubro de 2020), sobre a fraternidade humana e a amizade social; e Dilexit nos (24 de outubro de 2024), sobre a devoção ao Sagrado Coração de Jesus. Promulgou 7 Exortações Apostólicas, 39 Constituições Apostólicas, inúmeras Cartas Apostólicas, a maioria na forma de Motu Proprio, 2 Bulas de convocação de Anos Santos, além das Catequeses nas Audiências Gerais e discursos em diversas partes do mundo. Após instituir as Secretarias para a Comunicação e para a Economia, bem como os Dicastérios para os Leigos, Família e Vida e para o Serviço do Desenvolvimento Humano Integral, reformou a Cúria Romana com a Constituição Apostólica Praedicate Evangelium (19 de março de 2022). Modificou o processo canônico para as causas de nulidade matrimonial no CCEO e no CIC (M.P. Mitis et misericors Iesus e Mitis Iudex Dominus Iesus) e endureceu a legislação sobre crimes cometidos por membros do clero contra menores ou pessoas vulneráveis (M.P. Vos estis lux mundi).
Francisco deixou a todos um testemunho admirável de humanidade, de vida santa e de paternidade universal.”