Europa enfrenta o desafio de sustentar a Ucrânia sem o apoio dos Estados Unidos

O futuro da resistência ucraniana contra a invasão russa pode depender, mais do que nunca, da capacidade da Europa de agir sozinha. Diante da ameaça do presidente dos EUA, Donald Trump, de encerrar o apoio militar, líderes europeus se veem pressionados a encontrar alternativas para financiar e armar Kiev em uma guerra de longa duração. As informações são da agência Associated Press (AP).

Analistas apontam que, sem o suporte de Washington, a sobrevivência da Ucrânia no campo de batalha dependerá da disposição política dos países europeus em mobilizar dinheiro, equipamentos e inteligência. “Se fosse fácil, a Europa já estaria fazendo as coisas sem os EUA”, afirmou um diplomata europeu sob condição de anonimato.

Até agora, a Europa coletivamente enviou cerca de US$ 157 bilhões (R$ 887 bilhões) em ajuda à Ucrânia, US$ 26 bilhões (R$ 147 bilhões) a mais que os Estados Unidos, segundo o Instituto Kiel, da Alemanha. No entanto, Washington ainda lidera quando se trata de auxílio militar, principalmente em sistemas avançados de defesa aérea e inteligência estratégica.

Soldados dos EUA e de países europeus membros da Otan (Foto: x.com/US_EUCOM)

A substituição dos equipamentos norte-americanos seria um dos principais entraves. Embora França e Itália tenham fornecido sistemas de defesa Aster SAMP/T, a quantidade é insuficiente para cobrir a lacuna deixada pelos mísseis Patriot americanos, que protegem a infraestrutura crítica da Ucrânia contra ataques com mísseis hipersônicos russos.

“Não é uma questão de qualidade, é de quantidade”, explicou Douglas Barrie, do Instituto Internacional de Estudos Estratégicos de Londres.

O compartilhamento de inteligência também representa um desafio. As capacidades de satélite dos aliados europeus não se comparam às dos Estados Unidos, e empresas privadas, como a americana Maxar Technologies, já suspenderam temporariamente o fornecimento de imagens a Kiev após ordens políticas.

“Existem certas capacidades, incluindo vigilância de alto nível e reconhecimento por satélite, que só os Estados Unidos podem fornecer”, ressaltou Matthew Kroenig, do think tank Atlantic Council.

Apesar dos obstáculos, os especialistas afirmam que a Ucrânia ainda poderia resistir, mas com perdas humanas muito maiores. Para Thomas Gomart, diretor do IFRI, um think tank francês sobre relações internacionais, o problema ultrapassa o presente imediato.

“Esta questão não é sobre os próximos dois meses ou os próximos dois anos. Esta questão é sobre as próximas duas décadas”, declarou, reforçando que a guerra expôs a necessidade de uma reconstrução profunda da política de defesa europeia.

O cenário de incerteza se agrava com a proposta de Trump para encerrar a guerra: pressionar a Ucrânia a ceder territórios ocupados, como a Crimeia, à Rússia. A ideia representaria um rompimento com o princípio consagrado após a Segunda Guerra Mundial de que fronteiras não devem ser alteradas pela força.

“Levou uma guerra mundial para reverter anexações de fato, e 60 milhões de pessoas morreram”, alertou François Heisbourg, conselheiro especial da Fundação para Pesquisa Estratégica em Paris. “Os europeus não aceitarão isso e a Ucrânia também não”, acrescentou.

A memória das tragédias do século 20 e o temor de uma nova era de instabilidade impulsionam o esforço europeu para evitar a repetição da história. Para líderes do continente, a sobrevivência da Ucrânia tornou-se inseparável da própria segurança da Europa. E a busca por soluções para sustentar Kiev, com ou sem o apoio dos Estados Unidos, tornou-se uma prioridade estratégica.

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