
A Câmara dos Deputados aprovou, na noite de quarta-feira (7), a sustação de ação penal no Supremo Tribunal Federal (STF) contra o deputado delegado Alexandre Ramagem (PL/RJ). O parlamentar é acusado no âmbito da Petição 12.100, na Suprema Corte, que apura os crimes relacionados à tentativa de golpe de Estado que levou aos atos do dia 8 de janeiro de 2023.
A suspensão do processo foi aprovada em plenário por 315 votos favoráveis, 143 contrários e quatro abstenções. Com isso, o STF fica impedido de julgar Ramagem até o fim de seu mandato, em 2026. Isso porque, segundo a sustação, o deputado está protegido pela imunidade parlamentar, prevista na Constituição.
De acordo com a emenda constitucional 35/2001, que alterou o artigo 53 da Constituição, o STF deve, obrigatoriamente, informar o Congresso Nacional sobre denúncias recebidas contra deputados e senadores por crimes ocorridos após a diplomação. Após tomar ciência, a Casa Legislativa a qual o parlamentar pertence, por iniciativa de partido político e pelo voto da maioria de seus membros, pode sustar o andamento da ação.
Nesse sentido, o Partido Liberal entrou com pedido de sustação do processo, que foi analisado pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) e aprovado o parecer do relator, deputado Alfredo Gaspar (União-AL), ainda na tarde de quarta-feira. A solicitação foi ao plenário no mesmo dia, onde os deputados acataram o relatório previamente aceito pelo colegiado, e, logo em seguida, promulgada pelo presidente da Casa, deputado Hugo Motta (Republicanos-PB), na forma da Resolução 18/2025.
Com a promulgação, a suspensão do processo passou a valer imediatamente. O relator, deputado Gaspar, afirmou que cabe sustar a ação porque os crimes de tentativa de golpe de Estado e de abolição violenta do Estado Democrático de Direito e organização criminosa, dos quais Ramagem é acusado, teriam sido praticados após sua diplomação. “Sustar a ação penal não é jogar para a impunidade. É a paralisação do curso do processo até o fim do mandato, daqui a 1 ano e 6 meses”, declarou.
“Esta Casa não é menor do que qualquer Poder da República. Estamos decidindo os fundamentos das prerrogativas constitucionais deste Parlamento”, acrescentou. O texto aprovado prevê que será “sustado o andamento da ação penal contida na Petição 12.100, em curso no STF, em relação a todos os crimes imputados”.
Polêmica
O pedido de suspensão gerou polêmica entre os deputados. Isso porque o texto não especifica que a sustação do processo se refere ao deputado delegado Ramagem, sendo que a ação engloba oito acusados, inclusive o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Para o líder do Partido dos Trabalhadores (PT), na Câmara, deputado Lindbergh Farias (PT/RJ), a medida é uma tentativa de impedir o julgamento já marcado contra o ex-presidente e seus assessores. Ele ressaltou que a sustação vai beneficiar todos os acusados de tentativa de golpe de Estado que estão sendo julgados dentro da Petição 12.100. “Os senhores estão aqui querendo trancar a ação penal de 34 denunciados, com julgamento para começar”, declarou.
“No debate na CCJC, ficou nítido que o objetivo político é tomar uma decisão na Câmara dos Deputados para elevar a tensão e o choque com o Supremo Tribunal Federal”, acrescentou o deputado Orlando Silva (PCdoB/SP), que classificou o pedido como uma provocação contra o STF.
Parlamentares governistas ainda apontaram que a sustação é uma alternativa ao PL da Anistia, que está parado na Câmara. “Os golpistas de ontem e de hoje querem pegar uma carona e anistiar todos os núcleos que comandaram a tentativa de golpe do 8 de janeiro”, alegou a deputada Fernanda Melchionna (Psol/RS).
Por outro lado, o deputado Lafayette de Andrada (Republicanos/MG) ponderou que a Constituição prevê a sustação completa de uma ação penal, não sendo possível suspender apenas parte dela. “Ou susta-se a ação e, nela sustando, a consequência é que está sustado para todos. Ou não susta a ação, e não está sustado para ninguém”, afirmou.
“Ramagem foi colocado nessa ação para atrair pessoas que não tinham foro privilegiado. Mas essa estratégia não deu certo, porque respondemos à altura com a Constituição”, considerou a líder da Minoria, deputada Caroline de Toni (PL-SC).
O relator, deputado Gaspar, porém, esclareceu que o parecer não ampliou o escopo para livrar outros réus além de Ramagem. “Quem fez uma denúncia colocando todo mundo no mesmo vagão? Quem escolheu colocar Ramagem e os outros em uma mesma denúncia? O Ministério Público”, argumentou.
STF se nega a suspender ação
Antes mesmo do pedido de sustação ser aprovado na Câmara, o presidente da 1ª Turma do STF, ministro Cristiano Zanin, enviou um ofício à Casa Baixa afirmando que a suspensão não seria aplicada aos demais réus da ação penal, apenas a Ramagem e valeria somente para os crimes cometidos após a diplomação como deputado eleito, em dezembro de 2022.
Assim, o julgamento de Ramagem ficaria suspenso até 2026 em relação a dois crimes: dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado, que estão diretamente ligados aos atos de 8 de janeiro, que ocorreram após a data de diplomação.
As outras três acusações, que incluem abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado e organização criminosa, de acordo com entendimento do STF, ainda podem ser julgadas, já que esses crimes teriam sido cometidos em 2023, antes de Ramagem ser diplomado deputado, em janeiro de 2023.
No entanto, para o relator do pedido na Câmara, deputado Gaspar, mesmo os crimes que teriam ocorrido antes da diplomação estariam abrangidos pela sustação porque seriam “permanentes”, ou seja, se prolongaram no tempo.
Além disso, o STF alegou que não há previsão legal de sustação para outros réus, como Jair Bolsonaro (PL), uma vez que ele não detinha imunidade parlamentar na época em que os crimes dos quais ele é acusado foram cometidos.
Histórico
Ramagem foi ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). O deputado é o único parlamentar réu na ação penal do chamado Núcleo 1, que mira a cúpula ligada ao ex-chefe do Executivo que estão envolvidos na trama golpista.
O deputado foi indicado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) como um dos integrantes do “núcleo crucial” da trama por ter prestado suporte técnico, elaborando documentos para subsidiar ações de desinformação, especialmente em relação à segurança do sistema de votação eletrônico e à legitimidade das instituições responsáveis pelo processo eleitoral de 2022.